Com algumas semanas de atraso, o presidente Lula (PT) se apresentou para tratar da crise do IOF em uma expansiva entrevista coletiva, na qual sua disposição para fritar aliados se mostrou viva, assim como a de reafirmar sua disposição de buscar a reeleição em 2026.

A confusão em torno do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras, que diz pouco do ponto de vista eleitoral, mas traz enorme desgaste junto ao dito mercado, foi levada em banho-maria por um Lula em modo viagem internacional.

Não mais. Nesta terça (3), o petista rifou o ministro Fernando Haddad (Fazenda) novamente, dizendo que ele não errou, claro, mas é o culpado pela crise. “No afã de dar uma resposta à sociedade”, disse o presidente.

A sociedade no caso fica na Faria Lima e na classe média mais alta que, para todos os efeitos, já está procurando candidato para o ano que vem. Os estratos que apoiaram Lula e lhe deram a exígua margem de vitória sobre Jair Bolsonaro (PL) em 2022 não voltam para o ex-presidente, mas nem tampouco ficarão com o petista.

O cálculo é eleitoral: Lula sabe que a mesma Faria Lima apoia as tentativas menos intervencionistas, “liberais” entre aspas, da Fazenda. Então jogou Haddad no fogo, contando com que ele tenha alguma gordura para queimar, e buscando negar que seu governo segue uma cartilha de expansionismo fiscal às custas do alheio.

A entrevista de Lula foi reveladora em um aspecto central. Nela, o presidente se apresenta como o dono da bola no seu campo político, logo único candidato viável para a disputa do ano que vem. Com o cacife político de Haddad dilapidado e a falta de nomes a seu redor, é quase um truísmo.

O petista entregou seu jogo ao criticar mais duramente Eduardo Bolsonaro, o deputado licenciado que está nos Estados Unidos fazendo campanha para atacar aqueles que ameaçam pôr seu pai na cadeia.

Chamar Eduardo para o ringue, algo de eficácia em tese simples dado o voluntarismo e a sofisticação duvidosa da práxis política do filho Zero-Três de Bolsonaro, é na realidade uma forma de tentar manter a direita devidamente cindida.

O melhor cenário para Lula é a família Bolsonaro unida em torno do destino de Jair, que pelo andar da carruagem deve ser a prisão —inelegível ele já está. Assim como o próprio petista fez em 2018, quando fingiu que era candidato só para lançar o vice Haddad na undécima hora, o ex-presidente aposta cada vez mais numa solução “interna corporis” na Barra da Tijuca.

A especulação da vez é Eduardo, como já foi Flávio e é, na cabeça do PL, Michelle. A tática é a âncora que impede a direita brasileira de organizar uma candidatura, seja mais bolsonarista ou mais moderada, e isso é ótimo para um Lula titubeante hoje nas pesquisas de avaliação de governo.

Se mantiver o rumo, Bolsonaro irá deixar o presidenciável em tese mais forte do grupo, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), em posição de buscar uma reeleição tranquila em casa. Sobrarão então os nomes outros, ainda menos densos: Romeu Zema (Novo-MG), Ronaldo Caiado (União-GO), Eduardo Leite (PSD-RS) e quetais.

Seja o que for, o centrão, o PSD e o MDB só se mantêm nominalmente no governo, falando em alternativas para 2026 —e prontos para reembarcar se Lula ficar no cargo. Adicionando nebulosidade, o Congresso mostrou até aqui um misto de inapetência e paroquialismo ainda maiores do que o padrão usual, o que eleva o clima de paralisia.

Por óbvio, isso tudo é hoje. Ao manter seu espírito combativo que não poupa aliados na hora do aperto, e indicando o norte teórico de seus canhões, Lula mostra confiar na sua popularidade mais atávica e no efeito dos inúmeros coelhos generosos que tem sacado da cartola do governo para dizer que está no páreo.



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