A desembargadora Maria Lúcia Pizzotti, do Tribunal de Justiça de São Paulo, requereu nesta segunda-feira (12) ao presidente Fernando Antonio Torres Garcia a revogação do sigilo sobre a apuração do uso de carro oficial para levar um torcedor com a camisa do São Paulo Futebol Clube ao estádio do Morumbi.
Pizotti pediu a identificação de quem descumpriu as regras sobre uso de veículo do tribunal e a divulgação das “circunstâncias relativas ao lamentável e antiético episódio”.
Nesta terça-feira, o TJ-SP informou ao blog que “os fatos noticiados permanecem sob análise e o tribunal logo concluirá a apuração”.
“Por ocasião dos fatos, a viatura estava à disposição do desembargador Enio Santarelli Zulliani”, confirmou a Diretoria de Comunicação Social.
O pedido foi feito um mês depois de a fotografia do veículo de chapa TJ-081 ter sido publicada no site Metropoles, que revelou o caso. Pizzoti anexou cópia da reportagem.
“Usar um carro oficial, gastando gasolina paga com dinheiro público, é atitude repreensível, grave, despida de resquícios de pudor e de decoro judiciário, e por isso, há que ser investigada, de forma pública”, afirmou a magistrada no requerimento.
“Ainda que haja o indevido costume de se aplicar quase que genericamente sigilo nas apurações que envolvem magistrados, a regra de todo e qualquer procedimento administrativo é a da publicidade”, sustentou a desembargadora.
“Sigilo em tais casos protege apenas aquele que descumpriu normas éticas, mas desprotege a sociedade”, disse Pizzotti.
O nome de Zulliani circulava no tribunal, mas Pizzotti evitou citar, no requerimento, “quem foi o responsável pelo grave desatino”.
“Todos que fazem uso dos carros oficiais, desembargadores ou juízes de segundo grau, já exercem suas funções como magistrados há ao menos três décadas, tempo suficiente para conhecerem e aplicarem com rigor os deveres do cargo. Mas, ainda assim, o já longevo magistrado envolvido não o fez, e por isso, é preciso que se apure de forma ampla e transparente.”
“É preciso ter coragem para instaurar procedimentos contra desembargadores”, a desembargadora registrou na petição, citando o ex-presidente Pinheiro Franco, que “teve a necessária coragem” para apurar os casos de desembargadores que estavam com trabalho jurisdicional atrasado.
“Até pouco tempo, inexistiam escândalos envolvendo membros de nossa grande e respeitada corte. Infelizmente, temos vivenciado tempos difíceis e graves com envolvimento de magistrados em acusações de venda de decisões, crimes de abuso e violência sexuais, descumprimentos de regras envolvendo saúde pública em tempos de pandemia, ofensas a autoridades outras, em episódios antes conhecidos jocosamente como ‘carteiradas'”.
Voz contestadora
Maria Lúcia Pizzotti tem sido a principal voz contestadora dos atos do tribunal entre os 360 desembargadores.
Em 2017, ela acusou o então presidente Paulo Dimas Mascaretti de omissão, por não mandar apurar contratos com a empresa Argeplan, cujo sócio era o coronel PM aposentado João Baptista Lima Filho, amigo do ex-presidente Michel Temer.
Em 2019, o presidente Manoel Pereira Calças revogou a licitação de um projeto de prédio avaliado em R$ 1,2 bilhão. A concorrência estava suspensa após questionamento de Pizzotti a respeito da regularidade da tramitação.
Em 2020, o tribunal indeferiu pedido da desembargadora, que postulou a alteração da composição do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec).
No início da carreira, Pizzotti processou por difamação e injúria o desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, que tentou intimidar um guarda-civil municipal em Santos (SP) com uma “carteirada”.
Siqueira depôs contra ela, tentando impedir que se tornasse juíza com direito a vitaliciedade.
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