As próximas eleições presidenciais serão decididas por cerca de 10% dos eleitores, que não se identificam com o campo político lulista ou bolsonarista. Metade desse contingente de não comprometidos é composta pelos chamados microempreendedores.
Em 2022, votaram no candidato petista 52% deles. Agora, aprovam seu governo não mais de 45%. Os dados são do pesquisador Felipe Nunes, diretor da Quaest e professor da Fundação Getúlio Vargas. Se outros motivos não houvessem, bastaria esse a demandar que se entenda o que move tal grupo de trabalhadores, ocupantes de pouco menos da metade do mercado informal, estimado em 2023 pelo IBGE em 38,7% da força de trabalho.
Há controvérsias sobre quem sejam esses cidadãos. Certamente o são os autônomos informais —vendedores ambulantes; cabeleireiras; pedreiros; motoristas de táxi etc.—; os donos de pequenos negócios sem CNPJ; e os microempreendedores individuais formalizados por uma lei de 2008. Disputas cercam os trabalhadores de plataformas digitais —motoristas de aplicativo; entregadores de comida; e outros profissionais especializados— cuja autonomia para empreender é contestada por muitos estudiosos.
Se empreendedorismo é denominação recente, o fenômeno é bem mais antigo; remonta à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), promulgada em 1943 —anterior, portanto, às políticas neoliberais. Sem condições de abranger o conjunto dos trabalhadores, a octogenária CLT terminou por segmentá-los entre participantes do mercado formal, detentores de direitos trabalhistas, e os que deles não se beneficiavam e compunham o setor informal. Ao longo do tempo e ao sabor da conjuntura econômica, ele abrigou entre 40% e 60% dos trabalhadores ocupados.
O primeiro documento governamental a falar em empreendedorismo foi um estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência na gestão de Roberto Mangabeira Unger (2007-09). O filósofo e professor de Harvard —cuja aguda inteligência só perde para seu escasso senso político prático— foi também o primeiro a chamar a atenção para a revolução subjetiva, no plano da consciência coletiva, trazida por aqueles que denominou “pobres batalhadores”; gente que, sem esperar pelo empurrão do Estado para ascender, revelava uma “nova cultura da autoajuda e da iniciativa”. Nos empreendedores, ele viu a possível base social para uma renovada política de desenvolvimento: menos estatista e paternalista, mais habilitadora.
Estudos com base nos dados dos institutos Latinobarômetro e Lapop confirmam o diagnóstico de Unger. Os empreendedores parecem valorizar a iniciativa individual, a liberdade de escolha e a meritocracia. Ademais, tendem a ser conservadores nos costumes; desconfiam —como muitos outros brasileiros— dos partidos e do Estado; e são sensíveis ao apelo da antipolítica.
É contraproducente rotulá-los como pobres precarizados que, pelas artimanhas da falsa consciência, não se percebem como tal e, por isso, são capturados pelo discurso da direita. Convém tomar a sério suas visões do mundo, ancoradas na experiência de vida, e propor políticas que lhes façam sentido.
Até porque, como tudo indica, seus corações e mentes estarão no centro da disputa de 2026.
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