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A comédia dos quatro erros – 23/05/2025 – Demétrio Magnoli
 
O célebre jantar com Xi Jinping continua a assombrar Janja da Silva. As críticas, concentradas na primeira-dama, evidenciam duas inclinações paralelas do debate público brasileiro: a opção preferencial pela fofoca, especialmente quando o alvo é uma mulher, e o impulso deferencial de proteção do chefe de Estado, que seria vítima impotente de travessuras de seus familiares. No percurso, passa-se ao largo da política –e, no caso, da política de Estado.
De fato, a comédia chinesa abrange quatro erros. Janja cometeu o menor deles.
A palavra de Lula precisa ser levada a sério, para o bem ou o mal. Segundo o presidente, foi ele, não sua esposa, que infiltrou o TikTok à mesa de refeições. Erro número um: o Brasil, nação soberana, tem os meios para regular as redes sociais e, portanto, deve abster-se de reclamar ações de outros países. Xi Jinping presenteou Lula com essa aula gratuita de relações internacionais.
Na versão de Lula, Janja teria seguido o rumo que ele indicou, descrevendo os pecados do TikTok. Erro número dois: o presidente fala pelo Brasil, pois dispõe de mandato popular, mas a primeira-dama não exerce representação. “Não há protocolo que me faça calar”, exclamou ela, acendendo a tocha de um curioso feminismo amparado em atributos do marido. Nesse passo, revelou a ignorância típica dos ativistas: o “protocolo”, aqui, não é uma norma burocrática anacrônica, mas a fronteira que assinala a distinção entre o público (a soberania popular) e o privado (o laço de casamento).
Lula cometeu o terceiro erro, ao escandalizar-se com o vazamento dos diálogos. Na sua invectiva contra um sujeito oculto (Rui Costa?), o presidente definiu o evento como um “jantar privado”. Na verdade, era um jantar de Estado –ou seja, um ato diplomático oficial. O normal, em países democráticos, é dar publicidade às conversas travadas em encontros dessa natureza, com exceção de temas de segurança nacional.
O erro mais grave foi obra de Lula. Segundo o presidente, Xi Jinping aceitou sua solicitação de enviar ao Brasil um “especialista” na regulação das redes sociais. A ditadura chinesa cerca as redes com a “Grande Muralha Digital”. Seu alvo principal não são crimes de pedofilia ou pornografia, mas a palavra política dissonante. É como se Lula convidasse um especialista de Trump para contribuir com nossa política imigratória. Numa tentativa heroica de consertar o erro capital, o chanceler Mauro Vieira emprega o recurso extremo de desmentir o presidente, jurando que “não há nenhum programa de visita de especialista chinês”.
A comédia dos quatro erros não nasceu de um céu azul. Nos mandatos anteriores de Lula, o PT clamava pelo “controle social da mídia” —isto é, por algum tipo de censura da imprensa profissional. Hoje, só militantes febris ainda cultivam a antiga obsessão: o foco de quem manda voltou-se para as redes sociais. Sob o álibi da necessária regulação das redes, o governo sonha criminalizar a “desinformação” e o “discurso de ódio”, abstrações sujeitas à interpretação da autoridade estatal.
Diante de Xi Jinping, Janja teria afirmado que o algoritmo do TikTok favorece a direita. Crime digital? Não: trata-se da busca pelo “algoritmo certo”, capaz de favorecer a esquerda. Da Grécia clássica para cá, aprendemos que toda comédia contém uma tragédia.
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