A Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça de Minas Gerais abriu procedimento nesta sexta-feira (20) para investigar a decisão do juiz que mandou soltar o homem condenado que quebrou um relógio histórico nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
O juiz Lourenço Migliorini Fonseca Ribeiro, da Vara de Execuções Penais de Uberlândia, havia decidido pela soltura do mecânico Antônio Cláudio Alves Ferreira na última quarta-feira (18). Ele determinou a progressão para o regime semiaberto sem uso de tornozeleira eletrônica.
Na quinta (19), o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinou que Ferreira seja preso novamente e que o juiz mineiro seja investigado.
Ferreira foi condenado pelo Supremo a 17 anos de prisão e foi libertado após dois anos e quatro meses de detenção.
A reportagem não localizou a defesa do mecânico, que, nesta sexta, após a nova ordem de Moraes, ainda não havia sido preso.
“TJMG reafirma o seu compromisso com a legalidade, os princípios do Estado democrático de Direito e o irrestrito respeito às ordens judiciais emanadas dos tribunais superiores”, diz a nota do Tribunal de Justiça mineiro sobre a abertura de apuração interna.
Moraes afirmou que o juiz não tinha competência para tomar a decisão de mandar soltar o mecânico, e que o condenado não cumpriu o tempo suficiente na prisão para migrar de regime.
Ferreira cumpriu 16% da pena em regime fechado, mas, segundo Moraes, o correto seria que ele passasse para o semiaberto apenas após 25% do tempo total de condenação, dada a gravidade dos crimes.
Na decisão judicial que estabeleceu a soltura, o juiz disse que Ferreira cumpriu a fração necessária para receber o benefício, não cometeu nenhuma falta grave e tem “boa conduta carcerária”.
Moraes rebateu, no despacho proferido na noite desta quinta, dizendo que o juiz “proferiu decisão fora do âmbito de sua competência” e que não tinha autorização do STF para tal conduta.
Além disso, afirmou que o mecânico não cumpriu pena por tempo suficiente porque foi condenado por crimes de violência e grave ameaça, o que exige um percentual maior no regime fechado.
O réu foi solto sem tornozeleira eletrônica. Segundo o juiz, a medida foi necessária pela falta de equipamentos disponíveis em Minas Gerais. Como não há previsão para regularização da situação, afirmou o magistrado, o preso não poderia ser prejudicado pela demora do Estado.
A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas, ligada ao governo Romeu Zema (Novo), porém, disse que não procedia a informação de falta do equipamento e afirmou que há mais de 4.000 vagas ativas no sistema de monitoramento.
A pasta afirmou que em casos em que a pessoa possui residência em comarca diferente do presídio, como o de Ferreira, há possibilidade de soltura sem monitoramento, somente com prisão domiciliar.
Ferreira foi filmado por câmeras quebrando o relógio. O objeto destruído era o único exemplar da peça no mundo todo, dado de presente a dom João 6º pela corte francesa no início do século 19. A obra foi desenhada por André-Charles Boulle e fabricada pelo francês Balthazar Martinot, que era o relojoeiro de Luís 14, poucos anos antes de ser trazida ao Brasil.
A peça estava abrigada no terceiro andar do Palácio do Planalto, onde está localizado o gabinete do presidente Lula (PT), quando o local foi invadido por centenas de golpistas.
Os ponteiros e números do relógio foram arrancados e uma estátua que enfeitava o topo da peça foi arrancada. Em janeiro deste ano, a peça restaurada foi devolvida ao Palácio do Planalto.