A Polícia Federal prendeu nesta quarta-feira (18) o coronel da reserva Marcelo Câmara, ex-assessor de Jair Bolsonaro (PL) na Presidência da República e réu no processo sobre a trama golpista.

A decisão foi tomada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Militar), após o advogado do militar, Luiz Eduardo Kuntz, enviar à corte mensagens e áudios que teriam sido trocados entre ele e o tenente-coronel Mauro Cid sobre a delação premiada do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Com base nas conversas, o defensor pediu que a colaboração fosse anulada.

Em sua decisão, Moraes afirma que Câmara cumpria medidas cautelares que o impossibilitavam de manter contato com os demais investigados da trama golpista, inclusive por meio de terceiros.

“Dessa maneira, são gravíssimas as condutas noticiadas nos autos, indicando, neste momento, a possível tentativa de obstrução da investigação, por Marcelo Costa Câmara e por seu advogado Luiz Eduardo de Almeida Santos Kuntz, que transbordou ilicitamente das obrigações legais de advogado”, diz.

O ministro do STF ainda determinou a abertura de um inquérito contra o advogado e o réu pelo possível crime de obstrução de investigação. Câmara, Cid e o advogado devem ser ouvidos pela Polícia Federal em até 15 dias.

Kuntz enviou na terça-feira (17) ao STF fotos, áudios e mensagens de conversas que ele diz ter mantido com Cid de 29 de janeiro a 13 de março de 2024 pelo aplicativo Instagram.

No diálogo, o militar supostamente conta detalhes de seus depoimentos à Polícia Federal e faz desabafos sobre a falta de apoio de seus antigos aliados.

“O mais foda é sentir que eu estou ferrando todo mundo”, diz o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro em uma das mensagens. “Fruto de uma perseguição que eu não tive maldade que iria acontecer.”

Kuntz pediu ao Supremo que a delação de Cid fosse anulada sob a justificativa de falta de voluntariedade do colaborador. O motivo seriam mensagens do militar dizendo que a PF apresentava uma versão sobre a trama golpista de 2022 diferente da que ele alegava delatar.

“Eu fui bem claro lá… Pr [Jair Bolsonaro] não iria dar golpe nenhum… Ele estava mal”, diz uma das mensagens supostamente enviadas por Cid. “Ele queria encontrar uma fraude nas urnas… De forma oficial pelo partido. Muita gente estava tentando ajudar a encontrar uma fraude.”

Nos diálogos, Kuntz faz perguntas para Cid específicas sobre o que havia dito sobre Câmara à PF. “No seu acordo, vc tinha incluído deixar o Câmara de fora Tb ou ele não?”, perguntou.

“Pedi para o Dr Cezar verificar isso”, teria respondido Cid, em referência a seu advogado, Cezar Bittencourt. “Pq ele havia me dito que ele aceitou tudo.”


Marcelo Câmara é réu no STF sob a suspeita de monitorar a localização de Moraes no fim de 2022 para uma eventual prisão em meio à trama golpista. Ele nega as acusações.

Em outro momento do diálogo divulgado por Kuntz, o perfil que seria usado por Cid pergunta ao advogado o que Câmara havia falado sobre a acusação de monitoramento ilegal de Moraes —citado na conversa com o codinome “professora”.

Kuntz negou ter havido monitoramento paralelo ou uso de equipamentos sofisticados para saber a localização do ministro. Ele tentou ainda confirmar com Cid a informação de que o codinome “professora” não havia sido combinado entre os dois réus antes.

“Se puxar todas as conversas não vai ter isso”, perguntou Kuntz. O perfil que seria usado pelo militar respondeu: “Nunca vai ter nada”.

Kuntz disse ao STF ter sido procurado por Cid para conversar. Os dois se conhecem há anos por praticarem equitação e mantiveram relação de proximidade.

O advogado registrou todas as conversas que manteve com Cid nos primeiros meses de 2024 em um documento chamado Auto de Investigação Defensiva Criminal —instrumento regulamentado pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em 2018 para a obtenção de provas que defendam os interesses do cliente.

Ele afirmou à Folha que instaurou o procedimento em setembro de 2023 porque recebia informações fracionadas sobre a investigação. “Quando o Cid começa a falar comigo, eu aproveito que já estou com a investigação instaurada e registro todas as conversas”, disse.

“Esse auto não é muito comum, mas é totalmente previsto e não tem nada de irregular. É previsto, lícito, legítimo, tudo dentro do combinado”, afirmou Kuntz nesta quarta.

O advogado também destacou que considerada “tudo muito atípico”. “Um delator procurar um advogado para desabafar. Eu até achei que podia ser alvo de uma ação controlada dele, com a Polícia Federal, para produzir provas contra o meu cliente”, completou.

Kuntz disse que estava com todo o material pronto desde março de 2024. Ele afirmou que esperou mais de um ano para divulgá-lo porque esperava um momento oportuno.

“Eu quase juntei isso na [investigação do cartão de] vacina, porque tinha discrepância. Mas eu não queria queimar essa carta na fase de inquérito, não sabia se ia ter denúncia ou não. O momento de apresentar as provas é na acusação formal”, disse.



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