A mais recente pesquisa Datafolha, publicada por etapas a partir de 13/6, destaca dois fatos especialmente importantes para o governo. O primeiro é a dissociação entre os indicadores econômicos positivos —o crescimento do PIB e a expansão do emprego formal— e o sentimento ambíguo dos brasileiros em face da situação do país e de si próprios, agora e no futuro.
Aumentou o contingente dos que acreditam que, nos últimos meses, as coisas mudaram para pior no Brasil, entendendo embora para eles tudo continuou igual. Por outro lado, são otimistas as expectativas em relação ao país e ao entrevistado, que vê sua vida melhorando, a despeito de prever que a inflação e o desemprego continuarão em alta e que o poder de compra dos salários encolherá em futuro próximo.
Se avanço houve na macroeconomia, não parece que se tenha traduzido em inequívoca sensação de melhoria pessoal —muito menos em gratidão ao governo, reprovado pela metade dos entrevistados, ou ao presidente Lula, tido como ruim ou péssimo por 40%.
O segundo fato revelado pela sondagem é que o governo, quando comparado ao de Bolsonaro, não se sai muito bem em algumas áreas tradicionalmente valorizadas na agenda da esquerda. De fato, a parcela dos que consideram que o ex-metalúrgico tem se saído melhor que o ex-capitão é a mesma dos que o consideram inferior a seu antecessor na defesa do meio ambiente, nas políticas de saúde e naquilo que foi o carro-chefe das administrações petistas: o combate à pobreza. À primeira vista, um disparate. Só que não é.
Entrevistado no programa Roda Viva, da TV Cultura, no dia 16, o pesquisador Felipe Nunes, diretor da Quaest e professor da Fundação Getulio Vargas, observou que os brasileiros já não receiam perder conquistas sociais quando mudam os governos. Para que a mudança ocorresse, foi decisiva a continuidade do Bolsa Família no governo Bolsonaro, rebatizado como Auxílio Brasil.
De certa forma, o êxito de um programa, que torna onerosa a sua reversão —e o transforma em política de Estado—, dilui sua paternidade. Poucos se lembram que o SUS começou no governo Sarney; ou que o Fundeb se originou no Fundef, criado pelo ministro Paulo Renato de Souza, na gestão tucana.
Assim, a pesquisa Datafolha lança luz sobre obstáculos reais enfrentados pelo governo atual e que não se originam apenas em possíveis problemas de comunicação com o público ou de uma real falta de marca própria.
Feitos passados não garantem apoio no presente. Já iniciativas de formas mais ousadas de redistribuição —como a proposta de isenção de Imposto de Renda até R$ 5.000, compensada pela tributação dos super-ricos —enfrentam a oposição de interesses entrincheirados no Congresso.
Políticas sociais para além daquelas estabelecidas, como o aumento da atenção especializada no SUS; a melhoria da qualidade da educação; ou o fortalecimento de eficazes sistemas de monitoramento contra a rapina ambiental, custam caro e esbarram em intransponíveis limitações fiscais.
Tudo somado, no Brasil de hoje parece ser mínimo o espaço para a inovação progressista.
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