Jair Messias Bolsonaro, réu em interrogatório no Supremo, em 2025:
“Da nossa parte eu sempre estive ao lado da Constituição (…) Então, me desculpa, respeitosamente, vossa excelência, nós não estimulamos nada de anormal.”
Jair Messias Bolsonaro, então presidente da República, ao instigar apoiadores diante do Quartel General do Exército, em 2019:
“Acabou a época da patifaria. Agora é o povo no poder, não queremos negociar nada.”
O ministro Alexandre de Moraes concluiu no prazo previsto, e sem incidentes, o interrogatório do ex-presidente Bolsonaro e dos outros sete réus da trama golpista.
O ex-presidente optou por improvisar, sem usar o direito de permanecer em silêncio. Tentou minimizar os fatos, com a linguagem da caserna.
Moraes leu trecho de declarações de Bolsonaro:
“Perder uma eleição não tem problema nenhum, não podemos perder a democracia numa eleição fraudada. Não vou falar isso aí que o Alexandre está levando US$ 50 milhões. Não vou falar porque não tenho prova”.
Bolsonaro respondeu: “Me desculpem, não tinha essa intenção de acusar de qualquer desvio de conduta dos senhores três”.
“Minha retórica me levava a falar dessa maneira. Essa reunião não era para ser gravada, era reservada. Alguém gravou de má-fé, senão eu não estaria explicando aqui agora”, disse.
Na reunião gravada, o general Augusto Heleno disse que “o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições.”
Mesmo exercendo o direito ao silêncio, Heleno sugeriu que não tomou medidas ilegais “por falta de clima” ou de autorização de Bolsonaro.
O relator, tolerante nesta fase do julgamento, sorria a cada derrapagem ou sinal avançado.
Há críticas à superexposição do ministro Alexandre de Moraes e à condução do julgamento, o que é atribuído à inexperiência dos julgadores da trama golpista. À exceção do ministro Luiz Fux, nunca foram juízes.
O juiz não pergunta mais às partes. A inquirição é direta.
O excesso de heterodoxias de que Moraes se valeu —algumas necessárias, mas não todas— tornou-se objeto de críticas, dentro e fora do Brasil, não apenas por parte de bolsonaristas, opinou a Folha, em editorial.
Sobre afirmações e atos que estão na denúncia, interrogados alegaram ser expressões usadas com a soldadesca ou “bravatas” e “conversas de bar”, como disse o delator Mauro Cid.
A sessão no tribunal parecia contaminada pelo clima de camaradagem da tropa, um certo “me engana que eu gosto”, quando cada pessoa sabe que a outra está mentindo.
Generais acostumados a dar ordens contrariaram os defensores.
O ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, interrompeu o advogado Andrew Farias, que ensaiava uma pergunta citando a denúncia:
“Vai me perguntar sobre a reunião, cara?” Em seguida, tentou sugerir que uma pergunta não teria sido combinada antes com seu patrono.
Em fevereiro, o advogado Antônio Carlos Almeida Castro (Kakay), do Grupo Prerrogativas, festejou a denúncia do PGR Paulo Gonet contra Jair Bolsonaro.
“A investigação fez algo que deveria ser a regra: apurou, com rigor, o histórico do golpe”, Kakay escreveu na revista Poder360.
“Nenhum dos oito acusados negou o crime. O que se viu foi uma ginástica para defender a não-participação nos delitos”, afirmou, na ocasião.
Kakay estimou que o julgamento poderia ocorrer até setembro deste ano. Advogados calculam que em outubro o ex-presidente estará preso.
O mandato de Luís Roberto Barroso termina em setembro. O próximo presidente, ministro Edson Fachin, já iniciou o processo de transição com a equipe.
Moraes imprimiu um ritmo acelerado aos trabalhos. Mas o caso ainda pode se arrastar por alguns anos.
Em maio de 2012, havia pressão para que o julgamento do mensalão fosse realizado ainda naquele ano. O ministro Ayres Britto, presidente do STF, se aposentaria em novembro, e temia-se o adiamento para 2013.
O julgamento do mensalão começou em agosto de 2012 e terminou em março de 2014. As primeiras prisões foram realizadas em novembro de 2013.